Vale promete criar empregos
Empresa faz campanha para melhorar sua imagem
(O Estado de S. Paulo, 6/01/2009, p.B3)
por Mônica Ciarelli
A mineradora Vale entrou 2009 disposta a reverter os prejuízos causados à sua imagem pelo anúncio das demissões de 1,8 mil funcionários em novembro por conta da crise internacional. Com um anúncio de página inteira publicado, no último domingo, nos principais jornais do País, a empresa frisou que o número de trabalhadores cresceu em cinco mil ao longo de 2008. E ainda prometeu gerar 10 mil novos empregos até 2011, quando novos projetos da companhia vão entrar em operação.
Para o diretor executivo de Gestão e Sustentabilidade da Vale, Demian Fliocca, o ambiente de grande incerteza trouxe uma "visibilidade excessiva" ao ajuste feito pela Vale para se adequar ao cenário de queda de demanda por conta da crise global. Na época, a empresa cortou produção e anunciou férias coletivas e demissões em suas operações no Brasil e exterior.
O diretor lembra que a Vale tem como estratégica começar o ano com anúncios publicitários traçando um balanço de suas atividades. Mas, admite que o informe publicado teve como objetivo esclarecer a sociedade que as demissões de novembro ainda representam um porcentual inferior ao saldo de contratações realizadas pela mineradora ao longo de 2008.
"A Vale começou 2008 com 42 mil empregados no Brasil e encerrou o ano com 47 mil. Para 2009, o nosso compromisso com o desenvolvimento do País continua", diz o anúncio. Como toda grande empresa, observa Fiocca, a Vale registra uma movimentação intensa em quadro de funcionários por conta de projetos em que está envolvida. "A do final do ano (movimentação) ganhou uma visibilidade excepcional porque a pauta sobre se o Brasil sofreria com as turbulências internacionais estava muito intensa!, lembrou. E completou: "A Vale é uma das empresas que mais investe, ela tem uma imagem boa".
De qualquer forma a imagem da companhia sai arranhada do episódio envolvendo as demissões do final do ano, conforme o presidente do Sindicato dos Ferroviários de Minas Gerais e Espírito Santo, João Batista Cavalieri, que também uma cadeira no Conselho de Administração da Vale como representante dos empregados.
Segundo Cavalieri, é difícil explicar para a sociedade que uma empresa com lucros tão expressivos como os registrados pela mineradora brasileira precise fazer demissões para se adequar ao cenário de demanda mais fraca. "É claro que desgasta a imagem. Nesse momento, a empresa que conseguir não demitir sairá com uma imagem mais postiva", afirmou. Segundo ele, essa foi a mensagem que os sindicatos tentaram passar em suas negociações com a Vale nas últimas semanas para tentar evitar novas demissões.
Comentário
A Vale tem feito ao longo do tempo um investimento formidável para reforçar a sua imagem, sobretudo tendo em vista o impacto ambiental da mineração, o conflito permanente com os indígenas e mesmo as denúncias de favorecimento no processo de privatização.
O anúncio publicado no último domingo (04/01/2009) é mais um capítulo nesse processo sistemático de "limpeza de imagem" promovido pela mineradora.
O problema é que o presidente da Vale havia anunciado, no auge da crise, que a empresa estava se esforçando ao máximo para não demitir, enquanto o Sindicato confirmava que os cortes já estavam sendo feitos. Não dá também para acreditar na promessa inserida no anúncio deste final de semana porque a Vale não tem condições de prever o que irá acontecer daqui pra frente. No fundo, a empresa continua apostando no seu poderio econômico (quanto não gastou para publicar anúncio de página inteira nos jornais de maior prestígio?) para fazer vingar a sua imagem. Todos sabemos que ela vive de commodities e que os preços são ditados internacionalmente; logo, ela não tem qualquer controle sobre o seu futuro. Mas sempre, em virtude de sua comunicação arrogante e nada transparente, tentará fazer valer a sua versão.
Felizmente, numa sociedade conectada e com alternativas para o fluxo democrático de informações, a sua versão não será jamais a única. Está claro para todo mundo: como toda empresa que visa basicamente o lucro (apesar do discurso em contrário), demitirá a qualquer sinal de crise, mesmo que tenha lucrado brutalmente até agora. Seu compromisso é com os investidores e não com o interesse público. Ela não emprega por generosidade ou por acreditar no Brasil (esse discurso é hipócrita, convenhamos), mas porque ainda precisa de gente para tocar o seu negócio. Quando imagina que as pessoas podem ser descartadas, como a maioria das empresas, demite sem dó. |