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Avacalhando o conceito de sustentabilidade

Wilson da Costa Bueno*

     Como muitos outros conceitos (responsabilidade social, cidadania, inclusão social etc) que transitam livre e intensamente pelas páginas e telas da mídia brasileira, o conceito de sustentabilidade anda exibindo muitas faces ou cores, comportando-se como um verdadeiro camaleão. Na verdade, ele tem sido remodelado a cada instante, refém das empresas e autoridades que o manipulam , de tal modo que fica difícil reconhecer a sua legitima acepção.
      A imprensa, tradicionalmente, não é muito cuidadosa com os conceitos, talvez porque, sobretudo nos últimos anos, ela tem se preocupado mais em reproduzir falas e discursos do que em entendê-los ou validá-los. Ao não adotar uma perspectiva crítica, adepta generosa que é de todos os modismos, a mídia joga o conceito de sustentabilidade para lá e para cá, como um menino sapeca que chuta sua bola preferida para todos os lados.
      Mas essa postura não é nada saudável. Conceitos difusos implicam, necessariamente, avaliações nada precisas, contribuem para desqualificar a cobertura, confundem a audiência e, por isso, não agregam valor a coisa alguma.
      Se o conceito de sustentabilidade remete (acreditamos nisso!) a valores importantes na sociedade contemporânea, então está na hora de tratá-lo com mais respeito. A imprensa não tem o direito de maquiá-lo grosseiramente, porque ele só pode ser percebido em sua plenitude quando de cara limpa.
      Sustentabilidade não significa crescimento permanente dos negócios, como muitos empresários, respaldados pela mídia, tentam fazer crer. Nada tem a ver com o aumento absoluto de indicadores econômicos, como PIB, com o recorde de venda de automóveis e celulares, ou com exportações expressivas de commodities (minérios ou soja). Esta leitura tosca e viciada do conceito tem estado a serviço de grandes interesses, exatamente aqueles que continuam desfrutando de privilégios enquanto a maioria dos brasileiros se esfola para manter uma vida digna.
      Evidentemente, a sustentabilidade está associada à problemática ambiental, mas não se reduz a ela, mesmo porque o próprio conceito de meio ambiente costuma criar algumas armadilhas para os que dele se utilizam sem maiores cuidados. A sustentabilidade não deve ser vista como algo externo à cultura, à sociedade, ao próprio homem porque tem a ver com o comportamento e a ação de cada um de nós. Ela tem a ver com a biodiversidade, mas também com a sociodiversidade. Ela não é gerada pela boa vontade e disposição de alguns poucos eleitos, mas se constrói pela mobilização da coletividade.
     Simplesmente porque - é importante repetir - estamos todos no mesmo barco, submetidos à mesma e inexorável condição: ou nos salvamos todos ou não se salva ninguém. Todos já percebemos (você ainda dúvida dos relatórios dramáticos sobre as mudanças climáticas?) que as tempestades andam mais intensas, o calor mais insuportável, as guerras mais freqüentes e que há mais gente sem água para beber e morrendo de fome.
      O conceito adequado de sustentabilidade remete a uma dimensão mais ampla e que extrapola esta visão egoísta dos que faturam com a ciranda financeira, com a especulação nefasta, com a dança mesquinha das taxas de juros e do câmbio. O conceito de sustentabilidade tem a ver com compromisso, não com investimento. Sustentabilidade é algo que se implanta na alma e não apenas algo que se coloca no bolso.
      A sustentabilidade legítima, que a mídia insiste em não enxergar, tem a ver com a redução da pobreza, com os direitos das crianças e adolescentes, com o acesso à educação e ao trabalho, com a solidariedade, com o respeito à diversidade e à liberdade de expressão. A sustentabilidade está vinculada à valorização dos saberes e conhecimento tradicionais e inclui tanto os executivos das corporações quanto os povos da floresta. Ela decorre das políticas públicas, coordenadas pelos governantes, mas também de decisões individuais.
      A sustentabilidade tem uma dimensão essencialmente humana e precisa ser entendida desta forma sob pena de mascarar a realidade. Não é um conceito que pode ou deva ser apropriado por alguns ou favorecer alguns em detrimento da maioria.
      A imprensa precisa ter em conta de que cabe a ela um papel fundamental na sociedade e que, ao manipular os conceitos inadvertidamente, contribui para aumentar as desigualdades e para aprofundar as injustiças.
      A mídia não pode continuar esvaziando um conceito que nos é cada vez mais caro. Ela precisa, de uma vez por todas, comprometer-se com esta visão abrangente, com a sustentabilidade que tem a ver com o interesse público e não apenas com a permanência de seu próprio negócio.
      O conceito de sustentabilidade, corretamente utilizado, indica caminhos, resgata vivências e experiências e convida a todos para uma ação coletiva, solidária e corajosa. A imprensa, assim como aqueles que a pautam em seu benefício, precisam perceber que a sustentabilidade só será obtida se estivermos todos juntos. Como o conceito de ecossistema nela implícito, a sustentabilidade plena significa mais do que a soma das partes. Ela deriva de relações saudáveis, éticas, democráticas, equânimes e socialmente justas. Será que é tão difícil para a mídia compreender e divulgar esta verdade?

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* Wilson da Costa Bueno é jornalista, professor do programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da UMESP e de Jornalismo da ECA/USP, diretor da Comtexto Comunicação e Pesquisa.

 
 
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