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Comunicação Estratégica: história pra boi dormir

Wilson da Costa Bueno*

     A literatura, as comunicações em congressos e mesmo as falas dos executivos que transitam na área da comunicação das organizações, têm incorporado, com alguma facilidade, a tese (ou a certeza) de que, efetivamente, a Comunicação Empresarial brasileira se apresenta, hoje, como estratégica para as organizações.
      Será mesmo? Descontada a hipocrisia empresarial, é possível dizer que esta história está muito mal contada e que, na prática, o discurso está longe de se realizar.
     É verdade que os profissionais de Comunicação Empresarial gostariam muito que isso efetivamente acontecesse: afinal de contas, ela, se verdadeira, terá consolidado de vez a importância da comunicação no processo de gestão das organizações. Mas, para sermos justos com o conceito e com a realidade, precisamos considerar que a Comunicação Empresarial brasileira tem ainda que vencer alguns desafios e que eles, necessariamente, não são fáceis de serem superados.
      Em primeiro lugar, para que a Comunicação Empresarial seja assumida como estratégica essa condição deverá estar favorecida pela gestão, pela cultura e mesmo pela alocação adequada de recursos (humanos, tecnológicos e financeiros), sem os quais ela não se realiza . A intenção ou o desejo apenas não produzem a realidade.
      Em segundo lugar, devemos estar de acordo com respeito ao conceito de estratégia a que estamos nos referindo. O termo "estratégica" não pode ser utilizado como sinônimo de relevante ou fundamental. Assim, quando afirmamos que a Comunicação Empresarial é estratégica não estamos querendo simplesmente dizer que a organização a considera importante para alavancar os seus negócios ou para plasmar positivamente a sua imagem. Isso é pouco e desvirtua (ou restringe) o verdadeiro significado de estratégia.
      Podemos, simplificada e pedagogicamente, assumir estratégia como a forma (arte?) de definir e aplicar recursos com o objetivo de atingir objetivos previamente estabelecidos. O termo origina-se do jargão militar e tem a ver com a palavra "stratego" que, em grego, significa um general.
      O problema não se resume apenas aos termos que explicitam o conceito de estratégia, mas à sua inserção mesma em teorias (e práticas) de administração ou gestão. E há teorias e práticas de administração ou gestão aos borbotões, adaptadas a culturas empresariais, a dimensões (pública ou privada) etc. Cada guru de plantão cria a sua própria e executivos sem cérebro pagam uma fortuna para assistir às suas palestras em eventos internacionais de "management", o que confirma o nosso subdesenvolvimento em termos de gestão empresarial.
      A administração estratégica que realmente interessa maximiza a importância das condições sociais, dá ênfase à dimensão cultural e aceita o planejamento multifatorial, ou seja que não se limita ou prioriza a vertente meramente econômica ou financeira. Mais ainda: a comunicação estratégica não deve estar resumida a uma mera instância operacional, tarefeira, como parece tem sido a prática em nosso País.
      Pode-se facilmente perceber que, ressalvadas as honrosas exceções, a Comunicação Empresarial brasileira não atingiu ainda o patamar desejado. O planejamento em Comunicação (muitas vezes confundido com mera descrição de ações e produtos e correspondentes custos de execução) raramente está respaldado em cenários previamente desenhados; freqüentemente vislumbra a organização individualmente, sem considerar a presença dos concorrentes; e apenas recentemente está buscando desenvolver metodologias que permitem avaliar, consistentemente, os resultados de suas atividades (assessoria de imprensa, patrocínios, publicações etc). Na verdade, a própria definição dos públicos de interesse (os chamados "stakeholders") e o conhecimento detalhado de seu perfil são esforços pouco usuais na Comunicação Empresarial. Privilegia-se, básica e prioritariamente, a intuição dos executivos (que imaginam saber o que o mercado e os públicos demandam ou apreciam), o que, convenhamos, não está em sintonia com uma perspectiva estratégica.
      A Comunicação Empresarial não se sustenta em ambientes organizacionais em que esta perspectiva de planejamento esteja ausente. Ela só pode ser pensada, implantada e exercida, se a organização (empresa pública ou privada, ONG, entidade) adota e pratica a administração estratégica. Dificilmente, se poderia surpreender uma Comunicação Empresarial estratégica numa organização que fosse avessa a um sistema de gestão comprometido com este paradigma organizacional.
      Finalmente, para que tenhamos uma verdadeira comunicação estratégica será preciso dispor de estruturas e de recursos (humanos, financeiros, tecnológicos etc) que possam viabilizar a definição e a implementação das estratégias e a correspondente (e necessária) avaliação dos resultados.
      As equipes de comunicação, na maioria das organizações brasileiras, estão cada vez mais enxutas, com profissionais desempenhando múltiplos papéis e assoberbados com as instâncias de execução e controle. Pouco tempo lhes resta para a tarefa de planejar e reduzidas são as possibilidades de que possam comandar, após a execução das suas atividades, processos sistemáticos de avaliação.
      As estruturas de comunicação nas organizações não dispõem, necessariamente, de perfis profissionais capacitados para o planejamento e, dificilmente, estão previstas, para dar suporte a essa atividade, a construção de cenários, pesquisas de audiência (que dê conta dos principais públicos de interesse) ou metodologias adequadas para mensurar os resultados em comunicação.
      Não é incomum percebermos que, mesmo os produtos tradicionais da Comunicação Empresarial (house-organs e publicações de toda ordem, eventos e patrocínios, assessoria de imprensa etc), não merecem avaliação sistemática ou, o que pode parecer mais surpreendente, não decorreram de pesquisa ou planejamento prévio. Eles foram criados e são mantidos por absoluta convicção de que são necessários (embora muitos deles não justifiquem essa condição) e, muitas vezes, reproduzem modelos e padrões que não estão em sintonia com a cultura organizacional, com a dinâmica do mercado ou com os objetivos maiores das organizações.
      A Comunicação Empresarial estratégica requer, obrigatoriamente, a construção de cenários, fundamentais para um planejamento adequado e que, efetivamente, leve em conta as mudanças drásticas que vêm ocorrendo no mundo dos negócios e da própria comunicação.
      Ela deve considerar a segmentação dos mercados e da audiência, o que implica, necessariamente, em atentar para novos nichos de mercado e para perfis mais complexos de consumidores, que, em geral, acumulam múltiplos papéis e, portanto, múltiplas demandas informativas.
      A Comunicação Empresarial estratégica deve priorizar a personalização dos contatos, potencializada pelas novas tecnologias, mas admitir sempre que as formas de relacionamento dependem de contextos sociais e culturais específicos. Cada público, cada país , cada sociedade exibem características peculiares em função de seu background, de sua trajetória e de sua forma de contemplar o mundo. Deve também levar em conta que a sociedade se estrutura, gradativamente, em redes e que atravessamos, definitivamente, um momento de transição, em que os mercados convencionais vão sendo substituídos e, com eles, a forma de produzir e comercializar mercadorias (bens físicos ou culturais).
      A Comunicação Empresarial estratégica deve assumir a importância crescente dos chamados ativos intangíveis (marca, reputação ou imagem, rede de relacionamentos etc) e transitar, com desenvoltura, pela chamada "era do acesso, definido por Rifkin (2001) como aquela que transforma os recursos culturais em "commodities" e estabelece o império de uma economia conectada baseada em serviços.
      A Comunicação Empresarial estratégica precisa estar afinada com a proposta de gestão de conhecimento, que, como ela, está ainda mais difundida do que efetivamente praticada, e, definitivamente, resgatar a importância (estratégica!) da comunicação interna e valorizar a diversidade, o que implica em considerar a pluralidade de idéias, vivências e opiniões como atributos fundamentais do moderno processo de gestão.
      A comunicação estratégica, assim como a administração estratégica, não são mesmo para qualquer organização. Falar é sempre mais fácil do que fazer. Por enquanto, a comunicação empresarial estratégica é mais uma expressão vazia de realidade, manejada por executivos que não sabem o que dizem e por organizações que não sabem aonde querem chegar. Uma velha e insossa história para boi dormir.

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* Wilson da Costa Bueno é jornalista, professor do programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da UMESP e de Jornalismo da ECA/USP, diretor da Comtexto Comunicação e Pesquisa.

 
 
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